Marca italiana de chocolates Tree to Bar, Domori, do Grupo illy, quer crescer vendendo em lojas próprias e comprando mais participações em fazendas de cacau fino pelo mundo

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O CEO, Gianluca Franzoni, concedeu entrevista exclusiva para o Grão Especial.

Gianluca Franzoni

Gianluca Franzoni, CEO da Domori

Infelizmente, no Brasil, a marca Domori (www.domori.com) é pouco conhecida, o que é uma pena para os apreciadores de chocolate de verdade, ou seja, aquele em que a receita é, basicamente, cacau e açúcar, sem adição de outros produtos. Criada em 1997 pelo italiano Gianluca Franzoni, foi comprada pelo Grupo illy em 2006 mas, sabiamente, Gianluca foi mantido à frente do negócio, já que é um dos maiores conhecedores de cacau do mundo.

A princípio, sua paixão pelo mundo dos chocolates começou quando foi para a Venezuela, em 1993, num projeto que nada tinha a ver com cacau, e sim com a água. Mas, ao chegar, foi conhecer uma fazenda de cacau, a Hacienda San José, na península de Paria, estabelecida em 1830 e tocada pela família Franceschi, e se apaixonou pelo negócio. Morou três anos no país, aprendendo e ensinando tudo o que podia ao proprietário da fazenda, com vistas à melhoria da fruta. Desde 2002, a Domori adquiriu 50% da fazenda, e toca seu projeto de pesquisa e de constituição de seu viveiro de diversas variedades do cacau Criollo.

Domori Cacau Criollo

“Estudo comida e bebida desde que eu era uma criança, me formei em Business mas me especializei em gastronomia, com ênfase em pasta, vinho, café especial etc. Quando conheci a fundo os problemas e dificuldades do produtor de cacau, até então apenas uma commoditie, achei que realmente podia ajudar a melhorar a qualidade das amêndoas, já vislumbrando um novo mercado a ser trabalhado,” conta o CEO.

A variedade Criollo, a mais rara, é plantado apenas em 0,001% em todo o mundo. E toca estudar!! Em 1996, já de volta à Itália, Gianluca funda a Domori, com o conceito Tree to Bar, da árvore à barra, e cujas receitas são, em sua maioria, no mínino 70% cacau e 30% de açúcar, sem adição de mais nada.

E, também com um conceito de sustentabilidade no negócio que, até hoje, é muito difícil de ver replicado: o produtor é sócio no negócio e recebe um preço muito mais justo por sua colheita. Enfim, o sucesso da Domori prova que, sim, é possível ganhar dinheiro sem ser às custas do fazendeiro: em 2018, a empresa registrou vendas de 18,3 milhões de euros.

Gianluca Franzoni

Leia abaixo a entrevista completa com o CEO da Domori, Gianluca Franzoni.

Grão Especial: Gostaria que o senhor explicasse a declaração que consta na página principal do site da Domori: “I am only a humble servant to chocolate, and my true mission is to help change the history of fine cacao”.
Gianluca Franzoni: É a pura verdade! Minha grande missão sempre foi, desde o começo, entender como o cacau se comporta no campo, estudar sua genética e seus potenciais e torrar as amêndoas em baixas temperaturas. Desde sempre, a busca é pela excelência! Tentar tirar o melhor do que a planta está me dando! Isso quer dizer cuidado extremo no plantio, no pós-colheita, na fermentação, em todas as etapas do processo, até a barra de chocolate.

Grão Especial: Antes de chegar na Venezuela já entendia de cacau?
Gianluca Franzoni: Não, não entendia nada. Mas sempre, desde minha infância, era apaixonado pela gastronomia. Então, estudei pasta, vinho, cafés especiais, etc. Fui pra Venezuela trabalhar num projeto de tratamento de água para a indústria do turismo e, de repente, fui conhecer a Hacienda San José, que ficava perto de onde eu morava e me encantei. Isso porque, as culturas do café especial e do cacau são muito parecidas. A diferença é que pouquíssimos produtores de cacau ao redor do mundo sabem e têm condições de produzir seu próprio chocolate para poder melhorar a qualidade da produção do cacau.

Grão Especial: E em todo esse tempo na Venezuela, estudou o cacau?
Gianluca Franzoni: sim, estudei muito o cacau, suas variedades, características, plantio, colheita, tudo.  E me encantei com a variedade Criollo e como poderia ser preservada, já que é uma espécie raríssima, representando apenas 0,001% de todo o cacau colhido no mundo. É originária da América Central e México. Produz um cacau excepcional, ácido, aromático e pouco amargo.

Grão Especial: E quando decidiu montar sua própria empresa?
Gianluca Franzoni: Assim que voltei à Itália, em 1996. Em maio do ano seguinte, fundei a companhia na minha cidade natal, em Bologna. Comecei comprando cacau apenas de uma fazenda e, depois de dois anos, comecei a trabalhar com cooperativas ao redor do mundo. Criei meu próprio método de análise sensorial do cacau, baseado na minha experiência com o café, mudei alguns métodos na fazenda, ajudei nos processos de fermentação, e na fórmula de processamento, utilizando apenas a massa do cacau e o açúcar, nada mais. E criamos o Projeto Criollo, para poder perpetuar a espécie, tão rara e tão especial.

Grão Especial: E quais foram as dificuldades iniciais?
Gianluca Franzoni: Veja, nós fomos a primeira companhia a trabalhar apenas com cacau fino, da melhor procedência possível, o Criollo. Somos pioneiros em trabalhar apenas com cacau de origem única para a fabricação do chocolate. E também a nossa preocupação em gerar valor para o produtor. Queríamos, desde o começo, assegurar a sustentabilidade do negócio, oferecendo pagamento justo aos fazendeiros. As pessoas não estavam muito acostumadas com essa maneira de fazer chocolates 20 anos atrás. Mas entenderam perfeitamente a sofisticação da marca Domori.

Grão Especial: Então, a Domori é antecessora do movimento Bean to Bar dos EUA?
Gianluca Franzoni: Sem dúvida nenhuma. Sou o pioneiro no movimento Tree to Bar e temos a liderança na Europa e uma ótima entrada no Japão. E estamos redefinindo nosso modelo de distribuição nos EUA.

Grão Especial: Qual a principal diferença entre o cacau e o café na fazenda?
Gianluca Franzoni: Normalmente, o produtor de cafés especiais, conhece o que planta, sabe identificar na xícara, seu café, suas qualidades, e muitas vezes ele torra sua própria bebida, ou torra na propriedade vizinha. É relativamente simples.  Já o produtor de cacau, não! Raríssimos são os que processam o chocolate na fazenda. É muito complexo! O maquinário é complicado e caro! Dessa forma, o produtor de cacau sempre foi descartado na corrida pela busca da qualidade no processo de produção do chocolate. Existiam apenas dois pilares: a amêndoa do cacau e a grande indústria. O produtor nunca fez parte da busca pela qualidade. E nós mudamos isso!

Grão Especial: E hoje, com quantas origens a Domori trabalha?
Gianluca Franzoni: Atualmente, são sete: Venezuela, Equador, Peru, Colômbia, Madagascar, Costa do Marfim eTanzânia. Mas já tivemos em nosso catálogo chocolates da República Dominicana, México.

Domori Porcelana

Grão Especial: As barras de chocolate Domori de origem única são as mais procuradas?
Gianluca Franzoni: Sem dúvida nenhuma, são as mais procuradas. Mas também trabalhamos com alguns blends, caso do chocolate do Brasil, o Brasile, que é orgânico, proveniente de 17 fazendas familiares, localizadas ao longo do rio Xingu, no Amazonas. Compramos por meio de uma cooperativa, a Orgânica Central. E também com uma linha feita a partir das amêndoas de cacau Trinitário, que inclui blends de 70%, 80%, 90% e 100% cacau, além da linha Trinitário Collection, de quatro origens: Peru, Venezuela, Colômbia, Tanzânia e Madagascar.

Grão Especial: O que acha da qualidade atual da produção brasileira de cacau?
Gianluca Franzoni: Tem melhorado muito nos últimos anos, de forma consistente. Mas a origem mais comum do cacau encontrado no Brasil é o Forasteiro, e a Domori tem trabalhado com o Trinitário e o Criollo, basicamente.

Grão Especial: Qual a produção anual da empresa?
Gianluca Franzoni: Atualmente, é de 1,200 toneladas por ano.

Grão Especial: E o mercado brasileiro? É importante para a Domori?
Gianluca Franzoni: Em realidade, nunca discutimos o mercado latino americano. Estamos concentrados em outros mercados. Mas acredito que, com o novo direcionamento do novo General Manager do Grupo illy, o Brasil, principalmente, estará, em breve, em nossos radares.  Atualmente, os chocolates da Domori podem ser comprados na loja da Eataly, em São Paulo.

Grão Especial: Há interesse em abrir lojas próprias da marca no Brasil?
Gianluca Franzoni: Sim, claro! Mas é um assunto que estamos lidando nesse momento. Não sabemos se iremos ter lojas próprias ou trabalharmos em conjunto com as lojas da illy. Nosso distribuidor não é o mesmo, então complica um pouquinho. E existe o problema o problema de logística, uma vez que os chocolates precisam ser refrigerados. Mas, em breve, teremos novidades.

Grão Especial: E na Europa? Vão abrir lojas próprias?
Gianluca Domori: Sim, a primeira será em Milão ou Torino, estamos decidindo nesse momento, e será aberta ainda no primeiro semestre de 2020. E também em outras capitais europeias, estamos estudando. Abrir nossas próprias lojas nunca fez parte das nossas prioridades, mas as coisas estão mudando.

Grão Especial: Mas não faz mais sentido utilizar as mesmas lojas da illy?
Gianluca Domori: Essa também é uma discussão que estamos tendo no momento.

Grão Especial: E o modelo de parceria com os proprietários das fazendas de cacau, pode ser replicado
Gianluca Domori: Certamente. Nesse momento, estamos estudando a compra de novas fazendas, sempre no formato de joint venture, onde ficamos com 50%, entramos com o capital e tecnologia. Mas acho que não para esse ano. Mas para 2020, com certeza. Estamos avaliando ainda, e olhando atentamente para as oportunidades na América do Sul, principalmente. No nosso modelo de negócios, o importante é que o produtor se veja como um pilar para a melhoria do cacau fino. E que todo o mundo na cadeia do chocolate possa ganhar um rendimento justo por seu trabalho!

Gianluca Franzoni

Atualmente, a fábrica da Domori está localizada na cidade de None, em Torino.
Os créditos das imagens pertencem a Domori.

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