Exclusivo: Grão Especial entrevista Claudio Corallo

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Claudio Corallo é uma lenda no mundo dos chocolates Bean to Bar e dos cafés especiais.

Apontado como o criador do melhor chocolate do mundo, Claudio Corallo é florentino de nascimento, e conhecido como o rei da floresta tropical africana por seu trabalho plantando café no Zaire e cacau em São Tomé e Príncipe há mais de 30 anos, de forma sustentável. Vítima de malária por três vezes, nunca conseguiu se afastar da natureza por muito tempo, até agora. Preso em sua cidade natal, Florença, na Itália, desde o início da pandemia, Claudio conversou descontraidamente com o Grão Especial sobre chocolates Bean to Bar, cafés especiais Libérica, biodiversidade e muito mais. Confira.

Claudio Corallo

Créditos: Claudio Corallo cafés e chocolate

Depois de inúmeras tentativas de contato, finalmente tivemos um retorno de Claudio Corallo. Nossa conversa poderia acontecer em cinco minutos, via whatsapp. Quando conseguimos falar, ele estava confortavelmente sentado na varanda do hotel de uns amigos nos arredores de Florença, desde o fim de fevereiro, por conta da pandemia.

Saboreando um autêntico cubano, falou que conseguiu a hospedagem em troca de promover tardes de degustações de seus chocolates para os hóspedes. E que estava triste porque esse ano não conseguiu colher seu café e que, provavelmente, boa parte de seu cacau também vai permanecer no pé. “Terei menos prejuízo com o cacau, certamente, já que a colheita começa no final de maio e começo e junho e só termina em dezembro. Felizmente estão todos bem e o covid-19 não afetou a saúde da população de São Tomé e Príncipe. Mas a vida, sim. Tanto que o aeroporto do país está fechado e meus produtos não podem ser exportados e estão esgotados no site”. www.claudiocorallo.com. E sem previsão de recebimento.

Claudio Corallo

Créditos: Claudio Corallo cafés e chocolate

Claudio Corallo sempre foi apaixonado pelas florestas tropicais. Tanto assim que um de seus personagens preferidos era o Tarzan, estrelado pelo ator Johnny Westmiller. Mas antes de se aventurar nas profundezas da mata, foi estudar agronomia tropical pelo Instituto Agronômico Ultramarino de Florença, com a certeza de que não queria morar na Itália. A África sempre foi seu objetivo.

Aos 23 anos, abraçou uma oportunidade de ir trabalhar como broker de café no Zaire (atualmente, República Democrática do Congo) em 1979 e, depois de três anos, decidiu comprar no nordeste do país, suas primeiras terras para cultivar café Robusta numa altitude entre 850 a 1000 metros e que, em pouco tempo, foi considerado o mais caro do mercado internacional, chegando a produzir 800 toneladas por ano.

Créditos: Claudio Corallo cafés e chocolate

Ocorre que o país vivia sob a ditadura de Mobutu Sese Seko, notório por seu chapéu de pele de leopardo e sua bengala, além de ter sido um dos mais poderosos e autoritários governantes do continente.

A situação ficou insustentável e, em 1990, mudou-se com a família para São Tomé e Príncipe, onde adquiriu uma fazenda de cacau de 120 hectares chamada Terreiro Velho, formada em 1898 e que foi nacionalizada depois que o país se tornou independente de Portugal em 1975.

Claudio Corallo

A fazenda Terreiro Velho fica na ilha de Príncipe, no alto de um platô, com vista para o mar de Santa Barbara bay. O cacau é plantado nas encostas do morro, descendo até a praia. Nessa propriedade, também planta café Libérica (cujos frutos são grossos e duros e têm que ser descascados à mão, um por um) e pimenta. Créditos: Claudio Corallo cafés e chocolate

“Apesar de nunca ter gostado de chocolate, era fascinado pelo cacaueiro e seus frutos”, conta Corallo. As ilhas são vulcânicas e sua localização perto do Equador, fazem da região ideal para o cultivo do cacau.

Cacau brasileiro em solo africano

Corallo descobriu que as árvores de cacau de suas terras eram originárias do Brasil, da Bahia, de origem forasteiro amelonado. Até 1800, o cacau só era cultivado na América Latina. Dom João VI, em 1820, prevendo que iria perder sua principal colônia em breve, determinou que fosse levado para São Tomé e Príncipe, uma colônia “mais submissa”, nas palavras do próprio rei, mudas de cacau para serem cultivadas lá. O solo e o clima propícios fizeram o resto.

Claudio Corallo

Créditos: Claudio Corallo cafés e chocolate

O cacau forasteiro amelonado não é muito produtivo e, por esse motivo, muitos fazendeiros da Bahia preferiram substituir a espécie por híbridos, o que, mais pra frente, na história, mostrou ser uma das causas da doença da vassoura de bruxa que dizimou nossas plantações de cacau.

Créditos: Claudio Corallo cafés e chocolate

Corallo, como amante da natureza e profundo conhecedor do solo, adotou práticas, na época, pouco convencionais, que priorizavam a diversidade e o cuidado com a sustentabilidade. Sua plantação de cacau é orgânica, sem adição de agrotóxicos e pesticidas, de alta qualidade, com aromas e texturas excepcionais, permeados pela floresta atlântica.

“Um produto vivo não pode nascer numa terra morta”, preconiza Claudio Corallo. Créditos: Claudio Corallo cafés e chocolate

A princípio, sua única preocupação era com a roça de cacau e de como torná-la cada vez apta a produzir o melhor cacau possível. Mas começou a ficar decepcionado quando percebeu que os chocolate-makers não conseguiam produzir um chocolate da mesma qualidade que a sua fruta. Resolveu investigar, montou um laboratório na propriedade, confecionou ele mesmo o maquinário e passou a produzir seu próprio chocolate.

Créditos: Claudio Corallo cafés e chocolate

Sorte ou destino, seu primeiro comprador foi nada menos que a famosa loja inglesa, Fortnun & Mason, (www.fortnumandmason.com), inaugurada em 1707, em Picadilly, com quatro andares lotados do que há de mais sofisticado em alimentação, bebidas e presentes. Daí até alcançar a fama de produzir o melhor chocolate do mundo.

Créditos: Claudio Corallo cafés e chocolate

“Proporcionando às plantas de cacau a brisa do mar e a quantidade certa de luz do sol, o cacaueiro ganha vigor e produz de maneira saudável e abundante o ano todo. A qualidade do nosso trabalho começa com o cuidado na plantação, tal como a qualidade do vinho começa na vinha. Desde a poda das árvores de cacau até a moagem das favas torradas, cada etapa tem de ser feita com cuidado, paixão e amor,” define Claudio.

Créditos: Claudio Corallo cafés e chocolate

Depois de secos, o cacau é transportado em pequenos sacos de 30 kg, em pequenos barcos, que atravessam as 90 milhas que separam a ilha de Príncipe a de São Tomé.

Atualmente, Cláudio, também administra outra propriedade, na ilha de São Tomé, a Nova Moca, localizada na montanha mais alta da ilha, onde produz cafés especiais Caturra, Bourbon e Mundo Novo, em terraços protegidos por muros de pedra. Toda a sua produção é totalmente manual, incluindo a colheita. “Meus cafés são colhidos à mão e processados usando métodos naturais, todos desenvolvidos por mim, ao longo desses 35 anos lidando com o café”, se entusiasma.

A fábrica de chocolate também fica nessa propriedade e, emprega, ao todo, 250 pessoas.

Suas barras

Purista, Claudio Corallo não se preocupa em diversificar muito suas barras. “Produzo apenas quatro variações: 80% de cacau, de chocolate puro com cristais de açúcar; 73,5% de cacau, com o açúcar moído com o chocolate, com adição de nibs de grãos de cacau torrado; 75% de cacau sem qualquer outra adição e 70% de cacau com café Libérica.

Créditos: Claudio Corallo cafés e chocolate

Possui uma linha chamada Chocolate & …onde o cliente pode escolher entre chocolate com gengibre cristalizado, chocolate com laranja cristalizada ou chocolate com pimenta e sal do Algarve.

Créditos: Claudio Corallo cafés e chocolate

E, unindo suas duas paixões, o cacau e o café, criou a linha Chocolate e café. São três variedades diferentes de café arábica, o Caturra, Mundo Novo e o Bourbon, cobertas de chocolate a 55% de cacau, apresentadas numa caixa de 75 grama. Se preferir, pode escolher as barras de 70% de cacau com café Liberica.

Claudio Corallo

Créditos: Claudio Corallo cafés e chocolate

Já o Ubric 2 é um chocolate com 70% de cacau com passas destilado em um moscatel branco e o Ubric 3, destilado de moscatel rosa.

Como não poderia deixar de ser numa ambientalista que se preze, não há excessos de forma alguma, muito menos nas embalagens: são todas de papelão grosso, estampadas apenas com o logo Claudio Corallo num adesivo.

Pandemia

Por conta do Covid-19 e pelas dificuldades logísticas de São Tomé e Príncipe, Claudio está montando uma pequena fábrica de chocolates em Florença, para ajudar na exportação de seus produtos. “Desde 2018 nossas exportações estão muito prejudicadas graças às deficiências do aeroporto de São Tomé, considerado pouco seguro, e a logística é muito complicada também. Para embarcar as mercadorias rumo à Europa ou EUA, é necessário enviar, primeiro, para Moçambique, em Angola, de lá para Lisboa e só daí para o destino final. O custo do transporte quadruplicou! Encarece demais o chocolate”, finaliza.

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2 Comentários

  1. Paulo Silvestre em

    Excelente matéria com o mito Claudio Corallo. Parabéns!!!

    • Grão Especial em

      Obrigada!