De acordo com a Euromonitor International, o país ocupa a 88ª. posição no ranking mundial de consumo de chás, com média per capita de 19 xícaras por ano
Para que o mercado de cafés especiais crescesse no Brasil, foi necessário o amplo apoio do governo ao longo de vários anos e muito investimento e empenho de grandes empresas, principalmente da Nespresso e da illycafè. Ao mesmo tempo que ajudaram a disseminar junto aos produtores as melhores práticas de cultivo, tiveram papel preponderante na educação do consumidor, por meio de campanhas de marketing milionárias.
Os chás brasileiros, por sua vez, começam a seguir pela mesma estrada, agora com o protagonismo da Leão Alimentos e Bebidas (site) – empresa centenária de mate e chás, adquirida em 2007 pela gigante multinacional Coca-Cola -, aliada ao empenho da categoria para sensibilizar as autoridades em investir no aumento da produção nacional de mate e diversas ervas. E as semelhanças não param por aí.
É certo que o café é a preferência nacional de consumo, o segundo maior mercado consumidor atrás apenas dos EUA e o maior produtor do mundo, posição esta mantida nos últimos 150 anos. De acordo com estimativas do banco de investimento holandês, Rabobank, a produção brasileira de café, na safra 2020/21 será de 67,5 milhões de sacas. Já o consumo de café pelos brasileiros, no mesmo período, foi de 828,2 xícaras.
Mas é importante lembrar que a produção de chás no Brasil já teve uma significância econômica muito maior do que tem hoje. Trazido pelos primeiros imigrantes japoneses, a planta do chá, a camelia sinensis, se espalhou por diversas regiões do país e, entre 1980/90, o país chegou a ser um dos maiores exportadores do mundo, com uma produção concentrada principalmente, na região de Registro, interior de São Paulo.
Com os seguidos planos econômicos criados para recuperar nossa combalida economia de uma inflação galopante, a situação dos produtores de chás no país, sofreu revezes seguidos. O Plano Real representou o tiro de misericórdia, e os produtores viram seus negócios evaporarem. Com a paridade do dólar, o chá brasileiro deixou de ser competitivo. “O mercado internacional preferiu comprar chás do Ceilão, da China etc., que eram infinitamente mais baratos. Além disso, nunca houve um mercado interno forte de consumo do chá, diferentemente do que sempre aconteceu com o café”, conta o presidente da Associação Brasileira de Chás, Caio Barbosa (leia matéria aqui).
Mas as plantas de camelia sinensis, apesar de abandonadas, continuam por aí, espalhadas por todo o território nacional. Atualmente, o país vive um renascimento do consumo de chás e infusões, alavancado, inclusive pelo efeito da pandemia. Criada há dois anos, a AbChá, Associação Brasileira de Chá, já possui 67 associados, entre pessoas físicas e jurídicas e diversas escolas de chá que, juntas, já formaram mais de 1.200 alunos, profissionais aptos a atuar como teablenders, tea sommeliers e até produtores, principalmente de chás ortodoxos ou especiais. (Leia matéria aqui)
E, mais do que isso, milhares de chazais estão sendo redescobertos por essa nova leva de profissionais mais treinados e capacitados, que querem voltar a produzir chás brasileiros, para fornecer não só para o mercado interno como também para todo o mundo. Vontade sobra, mas é necessário suporte financeiro.
Segmento de chás no mundo
De acordo com relatório da Euromonitor International, o chá é a bebida mais consumida no mundo (em volume, quando considerado o total brewed) com tamanho global de mercado em 2020, de 356,2 bilhões de litros, representando um crescimento de 6,9% em relação aos resultados de 2019. A China é o mercado mais importante: só em 2020 movimentou US$ 12,2 bilhões, seguido do Japão com US$ 2,8 bilhões e os EUA, com US$ 2,7 bilhões. O Brasil ocupa a 88ª. posição.
Segundo a pesquisa, a indústria de chás é maior, globalmente, em volumes, do que as indústrias de cafés, águas engarrafadas e refrigerantes.
Blends, ervas e infusões brasileiras
Ainda de acordo com a Euromonitor International, o Brasil ocupa a 88ª. posição no ranking mundial de consumo de chás, com média per capita de 19 xícaras de chás por ano. Já um estudo do do Sebrae mostra que, até 2023, o setor deve crescer 43%, graças ao interesse do consumidor por alimentos e bebidas mais saudáveis.
A Leão Alimentos e Bebidas é líder disparado no segmento de chás blendados e infusões, com 64,5% de participação. No ano passado, teve um crescimento de 29% referente a chás para infusão. Sozinha, a empresa movimentou 4,7 mil toneladas de ervas no mesmo período, entre nacionais e importadas da Turquia, principalmente.
Segundo Marcelo Correa, líder do setor comercial e de desenvolvimento de negócios da Leão, estamos vivendo uma das maiores oportunidades de desenvolvimento do mercado do chá. “Se comparado aos outros países latino-americanos, o consumo interno ainda é muito pequeno. Mas temos a oportunidade, já, de desenvolver tanto o consumo quanto também a produção de ervas brasileiras, quer sejam elas para a utilização na Leão quanto também para outros produtores de bebidas”, diz.
“Nossa responsabilidade e papel são muito claros. Principalmente a de educar o brasileiro sobre a bebida, sobre sua história, diferentes maneiras de consumo, seja pelas embalagens, redes sociais e campanhas publicitárias, de todas as formas. Também cabe a nós explicar para o consumidor quais são as funcionalidades da bebida e como elas podem auxiliar no dia a dia. Para isso precisamos trazer inovações, lançando novas formas de consumo de chás, com produtos de diferentes formatos, e com combinações de sabores cada vez mais indulgentes”, explica. E acrescenta: “Nas últimas pesquisas realizada pela empresa, ficou muito claro que o consumidor quer bebidas mais saudáveis, e é por isso que o nosso portfolio de produtos mostra essa preferência, com produtos de maior saudabilidade e versatilidade”, afirma Marcelo.
Segundo o executivo, a cultura de consumo de chás no Brasil é, predominantemente, dentro do lar ou em ambientes em que se tenha acesso à água quente para a infusão. “Criamos produtos “on the go”, o que trouxe possíveis novos hábitos, já que possibilita levar o chá numa garrafinha para onde o consumidor quiser, seja na academia, ou no trabalho”, diz.
“O chá de preparo com água gelada, por exemplo, fez com que o consumo no Norte e Nordeste do país crescesse de maneira significativa”, conta. Aliado a isso, a presença dos produtos da marca nos principais ecommerces do país vêem auxiliando na disseminação do consumo de chás”, acrescenta.
Cadeia de produtores
A Leão compra grande parte da produção de erva-mate local para a sua produção. As outras ervas, porém, são importadas de diversos países. De acordo com levantamento realizado em 2019, a empresa possui 12 fornecedores de erva-mate cancheada. Cada fornecedor possui em torno de 300 produtores, sendo que cada produtor possui pelo menos três pessoas trabalhando no plantio, manutenção e colheita da lavoura. Com isso, estima-se que cerca de 10.800 pessoas trabalham diretamente com o cultivo e colheita de mate para a Leão. Se forem contabilizados empregos indiretos com trabalhadores no beneficiamento, torração, transferência, estoque, envase e insumos, este número pode triplicar, de acordo com dados da própria empresa.
É importante ressaltar que apenas 5% do volume da erva mate comercializada no país é direcionada ao mercado de chás. Os demais 95% são utilizadas pelo mercado de chimarrão e tereré, entre outros, que, diga-se de passagem, também está passando por um ótimo momento. (leia aqui matéria sobre a Inovamate)
Para o gerente geral de desenvolvimento organizacional e institucional da Leão Alimentos e bebidas, Fabiano Rangel, o crescimento desse mercado representa tanto um desafio e uma oportunidade, já que a cadeia da erva mate é praticamente toda nacionalizada. A planta é nativa da região Sul, dos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. “As outras ervas que utilizamos nos diferentes tipos de chás e blends que a Leão produz são adquiridos ao redor do mundo, centralizados e enviados para a Alemanha, onde a Coca-Cola, por meio de um parceiro, utiliza um processo de beneficiamento primário da erva, extremamente importante, que isenta a matéria-prima de qualquer risco microbiológico, sem perda dos óleos essenciais”, explica Fabiano.
Por quê importar as ervas?
De acordo com o executivo, não existe produção nacional de ervas com a escala necessária para suprir a indústria. Para ele, é preciso que haja um aumento significativa no consumo de chás, infusões e ervas para que possa gerar o desenvolvimento dessa cadeia regional e estar associada ao desenvolvimento de tecnologias para poder fazer a esterilização da matéria-prima sem maiores impactos do ponto de vista de híper-sensoriais ou de qualquer outra natureza.
“Hoje, na prática, quando trabalho com material seco (ervas para a produção do chá), do ponto de vista de esterilização e manutenção de qualidade, a indústria utiliza processo de irradiação, que não atende às nossas exigências de qualidade. A Leão precisa de um outro processo, o de pressão e temperatura, onde conseguimos garantir essa esterilização e, que, infelizmente, não existe no Brasil. E, ainda que eu tenha uma cadeia primária desenvolvida para me entregar esta matéria-prima, do ponto de vista de campo, do cultivo, eu precisaria ter uma agroindústria que estivesse apta a trabalhar essa parte do processo de esterilização da matéria-prima. É nosso desejo, nosso sonho? Sim. Se eu aumento a demanda, se eu aumento muito a escalabilidade dos produtos que de alguma forma se justifique, provavelmente, terão outros players interessados nessa parte da cadeia do chá. O que obviamente beneficiaria o mercado como um todo, e a nós, consequentemente”, diz.
Depois de esterilizados na Alemanha, o produto é acabado no Brasil. “Poderia ter camomila, cidreira ou outra erva nacionalizada em nossos produtos? Poderia, claro! O que acontece é que é necessário ter uma escala significativa para gerar interesse comercial no desenvolvimento da cadeia regional aliado a tecnologia para o cultivo dessas espécies. É nosso desejo? Sim, mas são necessários vários fatores, disponibilidade dos produtores e desenvolvimento da tecnologia e uma escala para segurar tudo isso”, completa.
Discutir o arcabouço regulatório
Fabiano levanta outra questão que, para ele precisa deverá passar por uma atualização, que é o arcabouço regulatório do setor de chás. “Com o aumento do hábito de consumir chás e a demanda crescendo, é necessário que discutamos a regulação do setor, que é muito antiga e que precisa ser atualizada nos mesmos níveis das agências internacionais, como a FDA americana, a europeia e a asiática. A ANVISA está muito distante delas, pois seus dados históricos são muito antigos e não evoluíram. E isso, obviamente, gera alguns freios na possibilidade de o mercado ampliar para outras oportunidades de sortimento, disponibilidade de blends, novos sabores, novas características, porque para o mercado evoluir, obviamente é preciso ter o amparo regulatório para isso. Isso acaba gerando grande dificuldade para os fabricantes criarem novas bebidas, misturando ervas com vegetais, frutas e flores”, finaliza.
Leão Alimentos e Bebidas
A Matte Leão era o carro-chefe da empresa Leão Junior S.A., fundada em 1901 por Agostinho Ermelino Leão Junior, na cidade de Curitiba, como uma companhia de industrialização de erva-mate. Os chás para infusão tornaram-se chá tostado com a marca Matte Leão em 1938. Em 2007, passou a integrar o Sistema Coca-Cola Brasil que, em 2012, após o processo de incorporação, passou a chamar-se oficialmente Leão Alimentos e Bebidas.
Na década de 50, no Rio de Janeiro, surgiu o hábito de se tomar o mate gelado nas praias e no Maracanã. Na década de 89, a Leão lançou o Mate Leão em copos selados.
Lançamentos da Leão
2016 – Senses – linha premium com ervas importadas da Turquia
2018 – Chás em cápsulas
2019 – Chás para infusão com água gelada
2020 – Chás funcionais 2021 – Chás para crianças Leãozinho