Certamente essa é uma pergunta que sempre ouço. E não apenas comparando os dois países sul-americanos. Novas “marcas de origem” do café têm se fortalecido no mercado mundial. Quênia, Etiópia, Panamá, Costa Rica…
Gostaria de deixar claro que sou um especialista em marcas e vou escrever sobre a minha visão.
Branding é sobre gestão de percepções
Não basta focar apenas no produto. Você pode ter o melhor café do mundo, mas se os consumidores não percebem dessa maneira, não adianta todo o esforço realizada no processo produtivo.
E como o Brasil é percebido? Durante muitos anos o nosso país focou na questão da quantidade. Orgulho de ser o maior exportador do planeta. Comercializando produtos com vários níveis de qualidade, alguns deles, que realmente não merecem comentários elogiosos. Isso gerou uma clara percepção negativa em vários mercados, especialmente o americano. “Um país que foca em volume de vendas, não consegue ter produtos de alta qualidade”, é uma narrativa corrente entre os importadores americanos, que não conhecem profundamente o nosso país.
Ouço muitas frases ditas com orgulho pelos produtores brasileiros como essa: “Sem o Brasil, o mundo não tomaria café” clara alusão à questão da quantidade. Isso deve-se ao fato que o café brasileiro ser a base da maioria dos blends comercializados nos principais mercados. Mas nesses blends, a comunicação do fabricante foca principalmente a origem colombiana, queniana, panamenha, que podem ter participação menor que a brasileira nesse produto específico.
O setor de cafés especiais do Brasil
Tenho trabalhado com o setor de cafés especiais do Brasil há alguns anos. E percebo que produto não é tudo. A boa gestão das percepções é fundamental. Vamos lembrar da célebre frase: “À mulher de César não basta ser honesta, tem de parecer honesta”
Trazendo para nossos dias, os nossos produtores insistem em focar muito do seu discurso na qualidade do produto. Ótimo e necessário para um país que não primou por cultivar uma boa imagem de origem. Mas qualidade é condição básica para participar do jogo. Temos que ir para esferas de engajamento superiores e gerar mudanças das opiniões correntes sobre nossos grãos. Em meus trabalhos de branding no mundo do café, percebo que os coffee hunters, procuram cada vez mais comprar produtos de alta qualidade, as joias raras que o Brasil tem e pode oferecer ao mundo, mas que também tenham um bom storytelling para mostrar. Consumidores compram marcas e não apenas produtos.
O investimento da Colômbia no marketing de seu café
A Colômbia tradicionalmente estabeleceu um padrão de atuação comercial com o foco dado pelo Governo da Colômbia e com a criação da marca Juan Valdez. Clara personificação do camponês que ama e vive do café, cuidando de seus grãos como se cultivasse um jardim.
Desde a década de 1960, a Colômbia vem investindo pesado no marketing de seu café, criando uma percepção de altíssima qualidade nos grandes mercados consumidores.
O Brasil precisa copiar a Colômbia e criar o Juan Valdez tupiniquim?
De maneira nenhuma. Temos criatividade para criar nossas próprias histórias. No atual momento do marketing 4.0, as mídias sociais valorizam as grandes ideias e menos os grandes orçamentos de advertising do passado.
O nosso desafio é centralizar e unir os esforços de várias entidades que existem no Brasil para passar uma mensagem única, criativa e inspiradora sobre os motivos de tomar um excelente café. Enquanto não unirmos esforços para fortalecer a marca de origem do café brasileiro, poderemos ver outros países ganharem mercado e agregar valor às suas vendas. Temos que pensar em exportar marcas e não commodities.
Júlio Moreira é Doutorando em Antropologia pela PUC-SP e Northwestern University (EUA) e Mestre em Administração de Empresas pela PUC–SP. Possui Pós-Graduação no Insead (França) e MBA pela BSP e University of Toronto (Canadá). É Bacharel em Administração de Empresas pela FGV e História pela USP. Também é professor de Marketing e Branding na ESPM e FGV e Sócio Diretor da Place Consultoria de Branding.
Contato no e-mail: julio@placebranding.com.br