E seus filhos, Boram e Goram, criaram a Um Coffee Co., apontada como a melhor cafeteria de São Paulo
O bairro do Bom Retiro, em São Paulo, ficou famoso ao longo de sua história a princípio pela sua generosidade em abrigar os imigrantes que chegaram a São Paulo a partir do fim do século XIX. Primeiro, vieram os italianos, depois os judeus, sírios, libaneses, turcos, russos e, a partir dos anos 90, bolivianos e coreanos. Por isso mesmo, a vocação do bairro sempre foi industrial e de comércio variado.
Mas o Bom Retiro, hoje, acabou se notabilizando por abrigar desde 2015, aquela que é apontada como a melhor cafeteria de São Paulo: a Um Coffee Co., sucesso absoluto de público e crítica. O Grão Especial foi lá bater um papo com Stefano Um, patriarca da família e quem começou o negócio com os cafés especiais, com a fazenda Um. O imigrante coreano que se apaixonou pelo Brasil, constituiu família e que faz do seu trabalho e de seus filhos, Boram e Goram, um importante alicerce de divulgação dos melhores cafés especiais brasileiros
Brasileiro de coração
Stefano nasceu em Seul, capital e maior cidade da Coreia do Sul. Em 1976, veio para o Brasil com seus pais e irmãos, no período pós-Guerra. Seu pai, era professor de inglês e, por conta da profissão, conheceu alguns militares brasileiros de alta patente, que o convenceram a imigrar com toda a família, a esposa e os cinco filhos.
Se mudaram para São Paulo, no bairro da Liberdade, conhecido reduto asiático na capital paulista. Stefano relembra sua chegada: “Com 12 anos era tudo novidade, mas foi um choque cultural, principalmente por conta da língua, mas a gente se adaptou. O país que eu mais amo agora é o Brasil. Eu sou brasileiro de coração, meu coração bate aqui”, se orgulha.
Então, conheceu sua esposa, que também é imigrante coreana, com quem teve dois filhos brasileiros: Boram e Garam. Formado em administração de empresas, sempre trabalhou na área de venda de eletroeletrônicos.
A introdução no mundo dos cafés
Em 2004, teve a oportunidade de conquistar a concessão da marca Samsung no Brasil, e cujos planos no Brasil incluíam a construção de uma fábrica. Escolheu a cidade de Varginha para a implantação da planta da Samsung, desconhecendo o fato de que a cidade é a uma das maiores cidades exportadoras de café do país. Lá, conheceu vários produtores e exportadores, com quem aprendeu a comercializar café.
O proprietário de uma dessas empresas convidou Stefano para uma parceria, cujo objetivo era a exportação de grão verde de café commodity para outros países. Começa aqui a história da família um com os cafés especiais.
Entretanto, em 2010, começou a pesquisar e a estudar sobre os cafés especiais, percebendo o grande interesse do mercado por cafés de qualidade. No ano seguinte, decidiu trabalhar com cafés especiais desde seu plantio.
A Fazenda Um
Foi então que adquiriu a fazenda um, uma pequena fazenda no Sul de Minas, em São Gonçalo do Sapucaí. “Comecei a plantar café em 2012 e nunca mais parei. Em 2018, por exemplo, já plantei mais de 48.000 pés de café. Nosso plantio é um pouco diferenciado, com plantação sombreada e um trabalho pós colheita igual ao da Guatemala. ” A Fazenda Um tem uma altitude média de 1300 metros, produzindo ao todo, oito variedades diferentes de café. E veem fazendo pesquisas com duas novas variedades.
UM Coffee Co.
Enquanto trabalhava com os cafés, seus filhos cresceram: Boram se formou em engenharia na Mauá e Garam em finanças, em Boston (EUA). Quando Garam voltou para o Brasil, os irmãos entraram de cabeça nesse universo dos cafés especiais fazendo cursos internacionais de Q Grader, torra e barista. Em 2015, abriram a Um Coffee Co. Como Stefano tinha um outro negócio, uma fábrica de tecidos no Bom Retiro, resolveram transformá-la na cafeteria.
Na realidade, são os irmãos que cuidam da cafeteria e da torra, que é realizada na própria Um Coffee. “ A escolha do bairro do Bom Retiro, por necessidade de otimizar custos, acabou virando um tiro certeiro. Atualmente, a cafeteria é reconhecida como uma das melhores do país.
O sucesso de público é tanto que, em apenas dois anos, já abriram outras duas unidades: uma no Itaim, zona chique de São Paulo e outra no Paraguai, com ajuda de um tio que mora por lá.
“Na cafeteria, vendemos grãos de outras fazendas, já que gosto de recomprar os melhores cafés do Brasil, para mostrar ao consumidor que existe cafés excepcionais no Brasil. E é claro que oferecemos os melhores grãos da minha fazenda são servidos na Um Coffe & Co”. acrescenta Stefano.
Atualmente, a Um Coffee Co. trabalha com 12 variedades de café e eles tem como política não blendar os grãos, valorizando o produtor e não o torrador. São parceiros oficiais das cafeteiras, a La Marzocco, máquinas de cafés espresso e os torradores Atilla. Na cafeteria, Garam, o mais velho dos herdeiros, é o responsável em ministrar cursos sobre o universo dos cafés especiais para o público em geral, uma vez que possui certificado da SCA da Inglaterra.
Diferença do cenário de cafés especiais: Coreia e Brasil
Como ainda tem parentes na Coreia, a família Um visita com frequência, o país asiático. Stefano aponta as principais diferenças na cena dos cafés especiais: “Na parte técnica, estamos 10, 15 anos atrás, eles são muito melhores que a gente em beneficiar o café. Eles têm condições de obter os melhores grãos do mundo, aqui no Brasil temos limitações por força da lei.”
“Já nas cafeterias, a diferença é imensa. Para se ter uma ideia, uma cafeteria na Coreia tem uma outra dimensão; lá uma cafeteria tem que ter um estacionamento de 300 carros para atender os clientes, o espaço é mais amplo, aqui ainda estamos engatinhando”.
A Coreia do Sul é o país com mais baristas do mundo, tem mais de 3000, aqui no Brasil, não temos nem mil, e a diferença de tamanho e população dos dois países é enorme. O Brasil precisa avançar muito ainda, afinal somos o país do café”, conta.
Lembrando que a população da Coreia do Sul é de 51 milhões de habitantes e que o país possui mais de 16 mil cafeterias. Café especial é um business muito sério no país.
Valorização do café brasileiro
Apesar de ver atrasos na parte técnica do cenário nacional, Stefano acredita que, como produto, o café especial brasileiro possui excelente qualidade. Sua receita: a valorização do nosso grão e o apoio técnico e financeiro aos pequenos produtores são a chave para melhorarmos o cenário nacional.
“O Brasil é imbatível em produção e qualidade, mas o resto do mundo ainda não reconhece. Nosso trabalho é valorizar nosso café, mostrar para o mundo que é um dos melhores. Eu já provei todos os melhores cafés do mundo, e eu tenho certeza que o café brasileiro é melhor que eles, mas não é valorizado. Falta uma estrutura básica, tanto do governo quanto dos empresários, temos que criar um fundo de investimento para incentivar o pequeno produtor brasileiro. São eles que fazem os melhores cafés do país”, se entusiasma.
O futuro da Fazenda Um e da Um Coffee Co.
A fazenda Um vai apostar cada vez mais no café sombreado e na fermentação dos cafés de sua produção. Já a Um Coffee Co irá abrir mais duas filiais até maio, uma em Pinheiros e a outra, no Morumbi. Goram e Boram apostam no crescimento do número de cafeterias da marca, abrindo novas unidades, bem como do crescimento da torrefação, já que querem torrar para fornecer para outras casas.
“Como nossa meta é valorizar o café brasileiro, tanto lá fora quanto no Brasil, queremos sempre melhorar a qualidade do café com um preço viável. O café com a maior qualidade possível com o menor preço possível é o nosso lema”, finaliza.